A novela que envolve a transposição do Rio São Francisco não acabou em 2022, com a inauguração de seu último trecho. Quase um ano depois de considerada enfim terminada, a obra agora sofre com o desligamento de bombas — o que afeta o fornecimento de água em regiões do sertão nordestino.
“Idealizada pela primeira vez em 1840, a transposição começou a sair do papel em 2007, por decisão do presidente Lupa”, escreveu Fernando de Castro, em reportagem publicada na Edição 160 da Revista Oeste. “Na época, foi planejada a construção de 699 quilômetros de canais, número que foi temporariamente reduzido para 477 quilômetros no ano seguinte, por força de atrasos e pela pressa do governo petista em tentar entregar a obra até 2012 — no governo de J B, a transposição voltou a ter os 699 quilômetros originais.”
Inaugurada com dez anos de atraso, o orçamento saltou dos iniciais R$ 4,5 bilhões para quase R$ 15 bilhões — média de pouco mais de R$ 1 bilhão por ano, de 2008 a 2022. Neste meio-tempo, a construção foi interrompida várias vezes, por problemas de planejamento e denúncias de corrupção. Diversas irregularidades foram constatadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Em 2018, a inauguração da Estação de Bombeamento 3 (EBI-3), localizada em Salgueiro, no Estado de Pernambuco, marcou o início das operações do Eixo Norte. A estrutura é composta de bombas e válvulas que levam a água por canais e reservatórios até os Estados do Ceará, da Paraíba e do Rio Grande do Norte.
Um dos canais de irrigação que recebem água da EBI-3 é a Barragem de Jati (CE), que integra o chamado Cinturão das Águas do Ceará (CAC). Sua função é encaminhar os recursos hídricos disponibilizados pela transição até Riacho Seco, no município de Missão Velha, localizado no sul do Estado. Com 56 metros de altura, a estrutura, com capacidade de acumular até 28 milhões de metros cúbicos das águas oriundas da estação de bombeamento, Jati começou a funcionar em junho de 2020. Contudo, um rompimento ocorrido dois meses depois da inauguração, interrompeu as operações até fevereiro de 2022.
Em janeiro de 2023, contudo, as bombas que integram a EBI-3 foram desligadas, interrompendo o fornecimento de água para as barragens do Eixo Norte da transposição. O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional assumiu a responsabilidade pelo desligamento, sob alegação de “anomalias” detectadas nos equipamentos. Apesar de os supostos problemas terem sido constatados em novembro de 2022, somente em janeiro deste ano houve a desativação do maquinário.
Sem as águas da EBI-3, o cenário atual na Barragem de Jati é de terra abandonada. O mato cresce entre o cimento, a pouca água que ainda existe está represada e o concreto seco começou a rachar.
*Revista Oeste.
Domingo, 16 de abril 2023 às 20:29