Presidente do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), o ministro Gilmar Mendes disse hoje (30) que o fim do voto
obrigatório não é uma solução para o processo eleitoral brasileiro e que o alto
índice de abstenção que vem sendo registrado nas eleições de 2016 enfraquece o
processo eleitoral.
Segundo ele, este número não traduz
toda a realidade. "Verificamos, por exemplo, que, nos estados onde a biometria
avançou mais, a abstenção cai de 18% para 10% ou 11%. Nestes locais, os
cadastros estão mais atualizados. Isto foi constatado fazendo uma leitura
crítica dos números da Justiça Eleitoral. Sobre eles pesam outros fatores, como
pessoas que morreram recentemente e que ainda constam como ausentes, ou ainda
pessoas que mudaram de domicílio e que também entram na estatística dos
ausentes”.
Mendes admitiu que, mesmo que se use
como parâmetro os 10 a 11% dos locais onde ocorreram votações biométricos, são
percentuais representativos. “Se por um lado ele pode refletir a insatisfação
da população contra a classe política, por outro enfraquece e debilita as
pessoas que recebem os mandatos, especialmente na hora da tomada de decisão em
um momento delicado como o atual”.
Chile
Durante entrevista na sede do Tribunal
Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ), o presidente do TSE se
posicionou contràrio à campanha contra a obrigatoriedade do voto, mas admitiu
que o índice de abstenção verificado no primeiro turno das eleições é
representativo, mas pode não ser real em razão de algumas desatualizações no
sistema.
Citando o Chile como exemplo, o
ministro criticou os que defendem o fim do voto obrigatório. “Queria aproveitar
para me posicionar contrário àqueles que se manifestam contra o voto
obrigatório. O Chile acaba de fazê-lo e acaba também de colher um catastrófico
resultado. O nível de abstenção foi de 60%, o que é um fato de deslegitimação
brutal das eleições”, avaliou.
O presidente do TSE destacou o fato de
que no Brasil o voto obrigatório está longe de ser um constraint [limitador,
inibidor] absoluto. No fundo, a multa de R$ 3 torna a justificativa muito fácil
e plausível de ser feita.”
Voltando a abordar a questão da
abstenção, Gilmar Mendes admitiu que não se pode ignorar ou desprezar o seu
percentual. “Claro que não quero desprezar o índice de abstenção. Ele é
significativo e não é difícil atribuí-lo a um certo desencanto, uma certa
relutância de se ver representado no quadro político que aí está. E isto a
gente houve até nos discurso dos jovens.”
Ele lembrou outro úmero que confirma
essa ideia. “Entre os eleitores facultativos, aqueles na faixa etária de 16 e
18 anos, o índice também caiu algo em torno de 3% em relação a 2014, o que
significa que temos menos inscritos nessas eleições.”
Para Gilmar Mendes, os números
surpreendem um pouco, “considerando todo esse movimento de jovens nas ruas, as manifestações
a partir de 2013 e tudo o que se seguiu. Portanto, isso talvez mostre que o
jovem que foi a rua necessariamente não imagine que o processo eleitoral atual
seja a solução para as mazelas que eles apontam”.
Contas
de Dilma
O presidente do Tribunal Superior
Eleitoral admitiu que o processo que analisa as contas da chapa da
ex-presidente Dilma Rousseff e do presidente Michel Temer só deve julgado no
ano que vem, uma vez que as atividades jurisdicionais só vão até o dia 20 de
dezembro, o que pode tornar inviável que a apreciação ocorra ainda este ano.
“É possível que só em dezembro a fase
de instrução seja concluída. Se chegarmos até fim de novembro sem a conclusão
do processo, acredito que muito provavelmente o caso só será discutido no
próximo ano”.
Sobre as pretensões do presidente
Michel Temer de que o julgamento das contas de campanha dele a da ex-presidente
se dê de forma separada, Gilmar Mendes admitiu que há precedentes nesse
sentido, mas que o TSE só vai analisar o assunto mais à frente.
Ainda sobre o julgamento separado das
contas, Gilmar Mendes lembrou o estado de Rondônia, onde, em 2006, o governador
Ottomar Pinto (PSDB) teve as contas rejeitadas, chegou a tomar posse, mas
morreu ainda no exercício do cargo, sendo substituído pelo vice na chapa, José
de Anchieta Junior, também do PSBD, que foi considerado inocente.
“É essa a questão que vai se colocar.
A pergunta óbvia: se a responsabilidade [se atribuída à presidente] vai se
estender ao seu vice. Esse é o único precedente que conheço com alguma analogia
com o quadro atual. O governador ganhou a eleição, foi impugnado e faleceu no
curso do mandato. O tribunal resolveu continuar o julgamento, mas entendeu que
o vice não era responsável pelo malfeito e o absolveu, julgando improcedente a
ação”.
Lendas
urbanas
Conforme Mendes, embora seja um
precedente a decisão não é uma analogia perfeita. “A questão que se coloca, e
que o próprio presidente [Michel Temer] já suscitou, é se o processo não seria
separável e que isso fosse colocado em uma questão de ordem. Mas nem é um
precedente nem uma analogia perfeita. É um caso que se aproxima. No caso atual
existe uma singularidade por causa do impeachment. Portanto, é uma decisão
anterior, o que não significa que o tribunal vá seguir essa orientação. É só um
caso parecido”, ressaltou.
O presidente do TSE esteve durante
toda a manhã de hoje no Rio de Janeiro. De uma escola na zona oeste da cidade,
ele acompanhou a abertura oficial do segundo turno das eleições. Em seguida,
ele esteve na sede do Tribunal Regional Eleitoral do estado, onde acompanhou a
chamada votação paralela, quando são testadas as urnas de segurança, segundo
ele um processo “extremamente sério”.
Depois de lembrar que o processo de
votação eletrônico no país está completando 20 anos, ele criticou o que chamou
de “lendas urbanas” relativas à desconfiança de muitos em relação ao processo.
"Estamos acompanhando esse processo de verificação e auditoria das urnas,
que é extremamente sério. A má divulgação dá margem a certas lendas urbanas".
De acordo com o ministro, o processo
da votação paralela é acompanhado por representantes da Justiça Eleitoral, do
Ministério Público, da imprensa e também das coligações partidárias.
Segunda-feira, 31 de outubro, 2016