Cerca de 20 horas antes da
invasão do Palácio do Planalto, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
dispensou por escrito o pelotão de 36 homens do Batalhão da Guarda
Presidencial. Atendendo a pedidos na sexta-feira, dia 7, o batalhão reforçou no
sábado a segurança do prédio. O domingo, porém, amanheceu na Esplanada com a
sede do governo federal apenas com o efetivo da guarda normal.
A segurança estava quase
desprovida de equipamentos de controle de distúrbios civis, como escudos,
bombas de gás e balas de borracha. A maioria do efetivo dispunha somente de
fuzis com munição letal.
Foi só no início da tarde que
o Comando Militar do Planalto (CMP), por iniciativa própria, entrou em contato
com o GSI e reenviou o pelotão ao Planalto. Mas foi uma tropa muito menor do
que a mobilizada em outras situações, a pedido do gabinete.
Por exemplo, o contingente
reunido em 24 de maio de 2017 para conter a ação de black blocks que pediam a
saída do presidente Michel Temer (MDB), acusado de corrupção pelo empresário
Joesley Batista, era 15 vezes maior.
No domingo, o Exército
acompanhava a ação na Esplanada por meio de drones – às 14h30, ocorreu o
primeiro confronto dos revolucionarios com a Polícia Militar, perto da catedral
de Brasília. Às 15 horas, o general Geraldo Henrique Dutra Menezes, chefe do
Comando Militar do Planalto, enviou uma companhia com 113 homens e equipamento
de choque, do Setor Militar Urbano (SMU) para o Palácio.
O general informou ao GSI o
envio da tropa. Era a primeira de três levas despachadas para retomar o lugar
das mãos dos infiltrados que executaram o que chamaram de “tomada de poder”.
Só então o gabinete formalizou
o pedido de reforço e ativou o Plano Escudo – que prevê a proteção do Planalto,
da Alvorada, do Jaburu e da Granja do Torto sem que seja necessária decretação
de operação de Garantia de Lei e Ordem (GLO). As duas levas seguintes de
reforço – com 93 e 118 militares – foram enviadas após o pedido do GSI.
Todos os militares saíram do
Setor Militar Urbano. Era ali que o Comando Militar do Planalto mantinha três
subunidades do Exército. Se não fossem elas, não haveria tropa pronta para
enfrentar os vândalos.
De acordo com os militares
consultados pela reportagem, era do GSI a responsabilidade de pedir reforço para
a guarda do Palácio do Planalto, assim como acionar o Plano Escudo.
O Estadão reconstruiu com
fontes militares que trabalharam no Batalhão da Guarda Presidencial, no GSI e
no CMP as 72 horas que antecederam os eventos de domingo, até a prisão dos
extremistas que estavam acampados na frente do Quartel-General do Exército. Os
fatos colocam o GSI no centro dos acontecimentos que levaram à invasão do
Planalto.
Existe desconfiança de que
ainda há pessoas ligadas às Forças Armadas, não identificadas, que participaram
dos atos de domingo. O Gabinete foi povoado por oficiais ligados ao
bolsonarismo na gestão do general Augusto Heleno. O fato levou o PT a
desconfiar da lealdade dos integrantes do GSI. Quando tomou posse, Lula da
Silva resolveu retirar sua segurança pessoal do gabinete para deixá-la com a
Polícia Federal (PF).
Na semana passada, o general
Marco Edson Gonçalves Dias, nomeado por Lula para chefiar gabinete, ainda não
havia escolhido sua equipe. Foi esse momento de transição – onde o fluxo de
informações da base para o comando fica comprometido – que foi aproveitado
pelos extremistas para atacar.
Desde o dia 2, o Comando
Militar do Planalto tentava esvaziar o acampamento em frente ao QG
paulatinamente, seguindo a estratégia defendida pelo ministro da Defesa, José
Múcio Monteiro Filho. Temia-se que uma ação violenta atingisse mulheres, idosos
e crianças. O esvaziamento do lugar parecia indicar que tudo ia como planejado.
Banheiros químicos e caixas d’água foram retiradas.
Cerca de 200 bolsonaristas
permaneciam no lugar. Rezavam e cantavam hinos militares. Oficiais ouvidos pelo
Estadão afirmaram que os remanescentes demonstravam “fanatismo”. Um deles
discursava dizendo que Bolsonaro deixara o País, mas assinara um decreto tornando
o general Heleno presidente. Outro dizia que o Brasil se tornaria comunista em
janeiro.
Para estrangular os acampados,
desde o dia 6, o CMP decidiu que ninguém mais entraria na concentração. Nesse
dia começaram a sair de todo o Brasil caravanas para a capital federal.
Chegaram mais de cem ônibus a Brasília, com 4 mil extremistas.
No domingo de manhã, em uma
reunião na Secretaria da Segurança do DF, os militares receberam informações de
que o protesto seria pacifico. Nesse momento, porém, grupos de bolsonaristas
não faziam mais segredo de suas intenções violentas. Integrantes do governo
desconfiam que essas informações foram sonegadas para comprometer a segurança
da Esplanada.
Quando a tropa do Batalhão da
Guarda chegou ao Planalto, o comandante da unidade, coronel Paulo Jorge
Fernandes, a levou até o quarto andar e, de cima para baixo, foi desocupando e
detendo os vândalos. Neste momento PMs da tropa de choque chegaram ao prédio.
Pelo Plano Escudo, eles deviam permanecer fora do prédio, mas o GSI os
convocou.
Ali, na frente do palácio, um
dos PMs em um cavalo havia acabado de ser agredido pelos invasores. Quando
entraram no Planalto, os policiais soltaram bombas de gás e passaram – segundo
militares do Exército – a agredir os detidos. Uma senhora rezando levou um
tapa. Outra de pé foi derrubada com uma rasteira.
Foi quando, segundo relato dos
militares do Exército, o coronel tentou conter os PMs e foi filmado. O vídeo
foi distribuído em redes sociais. Militares do Exército afirmam que ele foi
editado para dar a impressão de que o coronel queria dar fuga aos detidos.
Na versão do policial militar
que fez o vídeo, o coronel queria livrar os bolsonarista. As imagens passaram a
ser usadas por críticos da ação do Exército para pressionar por mudanças no
Ministério da Defesa. E, assim, o oficial se tornou alvo da esquerda. Mas
também da direita.
É que, no momento das prisões,
uma das detidas, uma mulher que parecia ter 70 anos, acusou o coronel: “O
senhor é um traidor”. Segundo relatos dos colegas, o coronel Fernandes ficou
abalado. Entre os detidos havia parentes de militares. Todos foram presos e
entregues pelo coronel à polícia.
À noite, o comandante do
Exército Júlio César de Arruda, o general Dutra, o ministro Múcio e os
ministros Rui Costa (Casa Civil) e Flávio Dino (Justiça) se reuniram por duas
horas e decidiram desocupar o acampamento pela manhã. Os militares acreditavam
que seria arriscado fazê-lo à noite.
Os militares localizaram ume mulher,
que se apresentou como líder dos acampados e ela concordou em conversar com os
demais. Ela explicou que quem quisesse permanecer deveria ficar à esquerda. Os
demais embarcariam nos ônibus e sairiam dali.
Às 6h30, após serem informados
de que seriam levados à PF, apenas 40 dos 1,2 mil acampados disseram que iam
resistir. Quando viram que todos os demais se dirigiram aos ônibus, esse grupo
também desistiu e se entregou. Terminava, assim, a chamada tentativa de “tomada
do poder” dos extremistas.
(Com o Estadão)
Quinta-feira, 12 de janeiro
2023 às 15:23
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