Tribunal
Superior Eleitoral aprecia, na terça-feira, ações que pedem a cassação da chapa
presidencial por abuso de poder. No dia seguinte, Supremo Tribunal Federal
decide sobre prosseguimento do inquérito que apura fake news e ameaças a
membros da Corte
O
presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem pela frente uma semana com dois
julgamentos importantes para o futuro político no Supremo Tribunal Federal
(STF) e no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ambos têm como pano de fundo
suspeitas de que o chefe do Executivo seja beneficiado por um grupo de
apoiadores dedicado a cometer crimes na internet. Na terça-feira, o TSE julga
duas ações que pedem a cassação, por abuso de poder, da chapa formada por
Bolsonaro e o vice-presidente, Hamilton Mourão, nas eleições de 2018. No dia
seguinte, o STF decide se dá prosseguimento ao inquérito que apura a
disseminação de notícias falsas e ataques a membros da Corte. Os julgamentos
também são de grande interesse para parlamentares da CPI Mista das Fake News do
Congresso, que apontam para o possível envolvimento de filhos e assessores do
presidente com a rede criminosa.
A
tendência do STF, conforme ministros ouvidos reservadamente pela reportagem, é
de decidir pelo prosseguimento do inquérito. Estará em julgamento uma ação do
partido Rede Sustentabilidade, protocolada em março do ano passado, dias após a
abertura da investigação. A legenda considera ilegal o fato de o procedimento
ter sido instaurado de ofício pelo presidente da Corte, Dias Toffoli, ou seja,
sem a provocação da Procuradoria-Geral da República (PGR). Também é questionada
a indicação do ministro Alexandre de Moraes para ser o relator, sem que tenha
havido sorteio entre os magistrados, como acontece normalmente.
O
inquérito foi aberto com base no artigo 43 do regimento interno do STF, que
permite que o tribunal instaure um procedimento do tipo quando houver “infração
à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, se envolver autoridade ou
pessoa sujeita à sua jurisdição”. Recentemente, o partido Rede Sustentabilidade
pediu ao ministro Edson Fachin para desistir da ação, mas o magistrado rejeitou
a solicitação a partir do entendimento de que a matéria é altamente relevante,
além do fato de que, nesse tipo de caso, não pode haver desistência.
Na
semana passada, o procurador-geral da República, Augusto Aras, em manifestação
ao STF, defendeu a continuidade do inquérito, mas cobrou a participação do
Ministério Público em todas as etapas.
Além
de julgarem o mérito quanto à legalidade do procedimento investigativo, os
ministros do Supremo, na sessão de quarta-feira, devem aproveitar a
oportunidade para enviar recados duros à cúpula do governo. No fim de maio, o
presidente da República proferiu ataques ao ministro Alexandre de Moraes depois
que a Polícia Federal executou, no âmbito do inquérito, uma operação para
cumprir 29 mandados de busca e apreensão contra empresários, blogueiros e
parlamentares bolsonaristas.
Na
ordem que originou a operação, o ministro do Supremo cita relatos de parlamentares
sobre a suposta existência de um “gabinete do ódio”, uma “organização
criminosa” que seria formada por assessores do Palácio do Planalto, comandado
pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e encarregado da disseminação
de fake news e ataques contra a honra de adversários do governo.
Bolsonaro
também participou de uma série de manifestações que pediam intervenção militar,
com o fechamento do STF e do Congresso. Na semana passada, porém, o presidente
ensaiou uma trégua, costurada pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo e
Silva, em uma tentativa de aproximação com Moraes. O chefe do Executivo chegou
a participar, virtualmente, da posse do ministro como membro do TSE.
Ministério Público
O
vice-presidente da CPI Mista das Fake News, deputado Ricardo Barros (PP-PR), é
favorável ao prosseguimento do inquérito, mas defende que seja garantida a
participação do Ministério Público. “O ministro Alexandre de Moraes não pode
pegar os policiais federais que estão à disposição dele e sair fazendo operação.
Está havendo uma exacerbação de parte à parte e que precisa ser contida. Os
depoimentos dos deputados Alexandre Frota (PSDB-SP) e Joice Hasselmann
(PSL-SP), para o ministro Alexandre de Moraes e também para a CPMI das Fake
News, criaram uma avenida de possibilidades de investigação. Isso está sendo
encaminhado. Eu acho que as duas investigações — a CPMI e o inquérito do STF —
chegarão a pontos comuns”, disse Barros, que também atuou como relator da Lei
de Abuso de Autoridade na Câmara.
“Vazou
a informação de que o IP de uma das máquinas que criaram o perfil ‘Bolsofeios’
estava no gabinete do deputado Eduardo Bolsonaro (PLS-SP). Então,
provavelmente, alguns dos assessores do Palácio do Planalto ou do gabinete
utilizaram, eventualmente, da ferramenta oficial para produzir e enviar
mensagens que podem ser consideradas fake news. Mas dizer que há um ‘gabinete
do ódio’ é um pouco de marketing”, observou o parlamentar.
“Eu
não acho que o presidente tenha um grupo de pessoas nomeadas para essa
finalidade. Não acredito nisso. Acho que pessoas nomeadas, eventualmente,
tomaram atitudes que não deviam ter tomado, disseminando, nos seus IPs
oficiais, a publicação de matérias que depois foram consideradas fake news”,
afirmou o vice-presidente da CPI.
Também
integrante da Comissão Parlamentar de Inquérito, a deputada Natália Bonavides
(PT-RN) afirmou que a atenção crescente do Poder Judiciário em relação aos
crimes virtuais pode ser atribuída ao possível envolvimento de familiares e de
aliados do presidente Bolsonaro. “A gente sabe que existe um significado no
fato de esse tema passar a andar. Acho que esse significado está na ligação
profunda que a família Bolsonaro tem com essa organização criminosa. Eu
observava na CPMI que os próprios filhos do presidente, o Eduardo e o Carlos,
segundo os depoimentos que a gente colheu, fazem parte dessa organização
criminosa, desse núcleo político, que dá o comando, que escolhe os alvos”,
disse.
“É
por isso que todas essas movimentações estão angustiando tanto o presidente.
Porque, em todos os lugares que a gente vê, aponta-se para essa ligação. Na
CPMI, por exemplo, a gente chegou à existência do ‘gabinete do ódio’, de
pessoas que são nomeadas na Presidência para atuar nessa organização. Chegamos
a um assessor do deputado Eduardo Bolsonaro, que, de dentro da Câmara, fazia
gestão de uma dessas páginas de fake news”, ressaltou Natália Bonavides.
Segundo
ela, o grupo, agora investigado por crimes cibernéticos, é o mesmo que atuou na
campanha de Bolsonaro em 2018. “Não é à toa que, no âmbito do próprio inquérito
do STF, o ministro Alexandre de Moraes, recentemente, estabeleceu diligências
que vão ao período de 2018. Isso indica que, na investigação do STF, também se
está chegando à conclusão de que os mesmos grupos que atuam hoje estavam
operando em 2018. Uma vez vencidas as eleições, eles colocaram os tentáculos
dessa organização criminosa no próprio poder público, com gente paga com
dinheiro público”, acrescentou a deputada.
*Correio
Brasiliense
Segunda-feira,
08 de junho, 2020 ás 10:00
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