Célebre
por sua atuação no impeachment, advogada e deputada estadual eleita critica
colegas que adotaram estratégias da velha política e se queixa de eleitores que
cobram dela lealdade extrema ao governo Bolsonaro
Enquanto
Dilma Rousseff era derrotada na disputa por uma vaga no Senado por Minas
Gerais, uma das responsáveis por sua queda comemorava uma vitória histórica: a
advogada Janaina Conceição Paschoal, de 44 anos, obteve a maior votação da
história para um candidato a cargo proporcional: 2.060.786 pessoas a escolheram
para assumir uma cadeira na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
A
dois meses de assumir o mandato, a coautora do impeachment, no entanto, está
preocupada. Janaina recebeu VEJA em seu escritório, em São Paulo, para esta
entrevista. Ela se queixa do “comportamento petista” de quem cobra dela
lealdade extrema ao governo de Jair Bolsonaro e manifesta apreensão com
possíveis alianças que considera espúrias, como com o senador Renan Calheiros
(MDB). “Não sofremos com tudo o que passamos para deixar como está”, reclama.
“As pessoas estão se adaptando muito rápido a tudo como sempre foi – e isso me incomoda.
”
A
senhora é candidata a presidente da Alesp. Está fazendo articulações políticas?
Negociando cargos com outros partidos? Nada muito formal ainda. Já conversei
com o pessoal do Novo e com o Barros Munhoz (PSB) duas ou três vezes. Além da
minha bancada, o PSL, que está fechada comigo. Ninguém de fora sabe, mas PSDB e
PT, que se engalfinham em público, são aliados na Assembleia e há tempos
dividem cargos. Eu só gostaria de ter alguém em sintonia na primeira secretaria
porque, como são três na Mesa Diretora, é preciso do 2 a 1 para governar.
Existe
algum projeto que a senhora gostaria de apresentar já no primeiro dia de
mandato? Quem apresenta projeto no primeiro dia é porque quer marketing, o que
não me interessa. Preciso assumir e, uma vez no cargo, pedir informações para
diversos órgãos para embasar meus projetos. Agora, tenho ideias no meu radar,
relacionadas a família. Quero, por exemplo, garantir às mulheres o direito de
fazer cesarianas na rede pública. Não sou contra o parto normal, mas ele não
pode ser imposto.
Pelo
seu discurso, percebo que a senhora pretende desnaturalizar práticas enraizadas
no Legislativo. Eu quero conduzir para o que deveria ser. Para que eu estou
saindo do meu sossego e me metendo em um imbróglio desse para deixar como está?
É como agora, que vão eleger Renan Calheiros para presidente do Senado. Não
sofremos com tudo o que passamos para deixar como está. Tenho falado isso para
colegas do PSL e escuto que “sempre foi assim”, mas é para mudar que estamos
entrando.
Em
situações como as negociações com Renan Calheiros e Rodrigo Maia, existe,
dentro do grupo que venceu as eleições, uma tensão entre adotar ou não as
estratégias políticas que sempre valeram no Congresso? Estou sentindo menos
conflito do que eu gostaria. As pessoas estão se adaptando muito rápido a tudo
como sempre foi – e isso me incomoda. Estou sentindo pouca disposição para
fazer diferente. E não estou falando de partido A ou B. Pessoas novas, que
entraram, e várias siglas que eu esperava que viessem para mudar estão me
dizendo que têm que ter o pé no chão e que eu sou muito idealista. Desanima um
pouco, mas eu sei que estou certa. Se quiserem me isolar, que me isolem.
O
presidente Jair Bolsonaro é um político de muitos mandatos. A senhora acha que
essa avaliação, de adaptação às práticas tradicionais, também se aplica a ele?
Ao Bolsonaro, não. Desde a campanha, convivi muito com ele e percebi que ele
tem a compreensão de que representa essa mudança. O que o governo não pode
fazer, e seria o grande erro, é o acordo com o Renan na eleição para a
presidência do Senado em nome do pragmatismo. A equipe econômica pressiona por
esse acordo pensando na reforma da Previdência. Está errado pensar que, se a
economia estiver bem, tudo estará bem. Estamos vivendo um processo de depuração
que não combina com pragmatismo. Se fizer acordo com o Renan, o governo ficará
refém dele.
No
governo do PSL está o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que admitiu
ter recebido doação por meio de caixa dois. É algo que a gestão Bolsonaro
deveria ter evitado? Foi divulgada uma lista envolvendo uma série de pessoas
que teriam recebido caixa dois, que é um crime eleitoral e precisa ser
investigado. Mas é claro que é de menor gravidade do que um delito de
corrupção, por exemplo. As autoridades precisam dizer o que será feito. Onyx
falou a verdade, devolveu o dinheiro e se arrependeu. O importante para o
governo é se garantir a partir daqui, porque tem uma responsabilidade muito
grande e não pode errar. Nem ele, Onyx, nem ninguém podem ter qualquer tipo de
privilégio em investigações por estar no governo.
O
que acha a respeito da promoção do filho do vice-presidente, Hamilton Mourão,
no Banco do Brasil? E sobre o caso que envolve Fabrício Queiroz, ex-assessor de
Flavio Bolsonaro, investigado depois que um relatório do Coaf apontou
movimentações financeiras atípicas? Sobre o filho do vice-presidente, eu
consultei diversos especialistas e realmente não há ilicitude. Não vou julgar o
rapaz, mas teria sido prudente não o promover. Em relação às movimentações, é
importante tomar cuidado. Se me emprestam 400.000 reais e eu devolvo, eu
movimentei 800.000 reais. Existem outros dezessete deputados com assessores
investigados, e é preciso investigar a fundo todos os casos, incluindo o do
Queiroz. As investigações estão sob sigilo e eu acho que seria importante que
não estivessem.
"Algumas
pessoas têm me cobrado uma postura ufanista em relação ao governo, de
entusiasmo e apoio a todas as medidas. Há pessoas que comentam que votaram em
mim e estão decepcionadas. Mas eu não enganei ninguém!"
A
senhora disse ter sido equivocada a decisão do ministro Luiz Fux de suspender
esse inquérito. O pedido do senador eleito Flavio Bolsonaro foi correto? Pode
ser um desgaste para o governo? Não me compete avaliar decisões de advogados em
situações concretas. Cada um decide o que é melhor para seu cliente. No
entanto, como cidadã brasileira, devo cobrar coerência nas decisões judiciais.
Entendo que a liminar contraria posicionamento adotado pelo STF. Esse é o
ponto. Minha abordagem é jurídica.
Nas
redes sociais, apoiadores do presidente Bolsonaro se dividiram entre criticar e
defender episódios como esse. Como tem percebido esse comportamento? Algumas
pessoas têm me cobrado uma postura ufanista em relação ao governo, de
entusiasmo e apoio a todas as medidas. Há pessoas que comentam que votaram em
mim e estão decepcionadas. Mas eu não enganei ninguém! Eu sou uma pessoa
crítica, o que é diferente de jogar pedras. Vou combater o que chamo de
“comportamento petista”. Vocês têm amigos petistas? Eu tenho vários, e eles
aplaudem tudo que é dito [pelo partido] sem nem pensar sobre.
Então
a senhora está vendo semelhança dos apoiadores do presidente Bolsonaro nas
redes com uma espécie de “comportamento petista”? Sim, mas felizmente os
“bolsonaristas” que têm essa postura são a minoria da minoria, enquanto esse é
um comportamento de quase a totalidade dos petistas. Meu discurso na convenção
do PSL, não sei se você se lembra, foi sobre isso [naquele dia, a advogada
disse que seu partido não pode ser o PT “com o sinal trocado”]. Não podemos
seguir por esse caminho.
Sua
postagem sobre a decisão do ministro Fux obteve um grande alcance nas redes
sociais. Como foi a repercussão? Não tive tempo de fazer uma análise detida,
mas li uma matéria no UOL que mostrava que os seguidores estão cobrando
explicações [do caso Queiroz]. Respirei aliviada. Isso mostra a diferença em
relação aos petistas. Nosso país, ao que parece, está amadurecendo.
A
senhora acha que ainda não há um entendimento de que é possível ser de um
partido e eventualmente criticá-lo? Sou uma ferrenha defensora da candidatura
avulsa. Estou sendo procurada por pessoas que querem criar o PSL nas suas
cidades, mas não me sinto à vontade com essa dinâmica de partido. Queria que
mudasse essa mentalidade nas pessoas. Ou, quem sabe, o lugar na minha cabeça é
fora do Brasil? Eu saí da USP porque eu queria ter liberdade para falar, e lá
por qualquer coisa queriam fazer sindicância. Às vezes eu fico pensando se
posso ajudar mais de fora. Vamos ver quanto tempo eu vou aguentar.
Sua
posição é favorável à posse de armas? Sim. Quando houve o referendo do
desarmamento, era a única professora da USP que fez campanha pelo “Não”. Não
sou ativista pró-arma e não fico fazendo gesto de arminha pra lá e pra cá. Hoje
o criminoso tem certeza que você está desprotegido. Se tentarem invadir meu
escritório, que fica perto da Avenida Paulista, e eu ligar para a polícia
agora, vai demorar no mínimo quinze minutos para chegar. O Estado não tem
condições de prover segurança para todos. Depois do desarmamento, os crimes
patrimoniais, como roubo e latrocínio, aumentaram muito.
E
o porte? A senhora também é a favor? Sim. Antigamente, era normal ter armas e
era uma segurança pelo efeito psicológico. Os criminosos não têm como saber se
você está armado ou não. Estupro, por exemplo, é um crime que subiu muito, e a
mulher poderia ter como se defender se existisse o porte.
Seu
discurso é de mudança na prática. Em seu gabinete, o que pretende fazer para
economizar dinheiro público? Tenho direito a 32 assessores, mas devo trabalhar,
aproximadamente, com dez pessoas. Não sei quanto terei de verba, mas sou muito
econômica e serei mais ainda com o recurso público. E também serei honesta.
Você acredita que recebi um e-mail de uma senhora que estava com um problema em
um processo e pedia para eu usar minha influência em favor dela? Delicadamente,
respondi que não, mas que esperava honrar o voto dela. Recomendei que
procurasse um advogado e, se fosse injustiçada, recorresse ao Ministério
Público. Ela respondeu que nunca mais votaria em mim, que era um absurdo um
deputado que não ajudava quem votou nele. Outro homem me disse que fez campanha
para mim na cidade dele e queria um emprego. Neguei, e ele me criticou dizendo
que eu poderia ter 32 assessores, então deveria contratar ele. (VEJA.com)
Sábado,
19 de janeiro, 2019 ás 00:05
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