Com
o objetivo de prevenir a violência sexual, diversas mulheres estão encontrando
no aplicativo Malalai um aliado para efetuar deslocamentos com mais segurança.
Criado pela arquiteta mineira Priscila Gama, ele oferece informações que ajudam
na escolha da melhor rota, além de possibilitar que amigos ou parentes
monitorem o trajeto e sejam acionados em caso de emergência.
As
usuárias do aplicativo têm acesso a um mapa onde é possível consultar
informações como iluminação da via, movimentação, existência de ponto comercial
aberto, presença de porteiros ou de segurança privada, presença de posto
policial e ocorrência anterior de assédio.
"São
características muito específicas, que o Google Maps, por exemplo, não
informa", diz Priscila.
Ao
mesmo tempo, é possível eleger uma companhia virtual para seguir o trajeto, ou
seja, uma pessoa que irá receber mensagens informando detalhes do deslocamento
até o destino final.
Há,
na ferramenta, um botão de emergência, que permite pedir socorro de forma ágil.
Ao ser acionado, um alerta com a localização é enviado para até três pessoas
escolhidas. É possível ainda criar um atalho deste botão na tela inicial do
celular, para que se possa recorrer a ele mais rapidamente.
Por
enquanto, a tecnologia só está disponível para Android. O aplicativo ainda está
na fase de testes, mas já é bem avaliado. Na Play Store, onde é possível fazer
seu download, a média das notas concedidas pelas usuárias é de 4,6, em uma
escala que vai de 0 a 5.
De
acordo com Priscila Gama, cerca de 300 mulheres em todo o Brasil já fizeram o
download, das quais metade se mantém como usuárias ativas. Em fevereiro, o
aplicativo deverá estar disponível para iOS e será finalizada a segunda versão
para Android.
Para
custear todo este desenvolvimento da tecnologia, será lançado no mês que vem
uma campanha de financiamento coletivo. A arquiteta espera arrecadar R$ 17 mil.
Outra
novidade que deverá ser anunciada em breve é o lançamento de um hardware, um
colar com um pingente que esconderá um botão de emergência. Inicialmente, 20
usuárias irão recebê-lo gratuitamente.
"Um
dos nossos estudos mostrou que mulheres evitam mexer no celular na rua porque
acreditam que isso pode atrair violência. Daí a ideia de ter, atrelado ao
aplicativo, um dispositivo na forma de uma joia ou um chaveiro. Outras peças
poderão ser criadas no futuro", afirma Priscila. Ela diz que se a meta de
R$ 17 mil do financiamento coletivo for superada, a cada R$ 500 extras será
doado um colar a uma mulher em situação de vulnerabilidade.
Origem
A
ideia do aplicativo surgiu em 2015, quando a organização não governamental
Think Olga desenvolveu a campanha #PrimeiroAssédio. O objetivo era estimular as
mulheres a contar, nas redes sociais, as agressões que já tivessem sofrido.
"Houve
um relato que me chocou muito, que foi o de uma mulher estuprada em um taxi.
Ela desmaiou e acordou na rua sentindo dores. Mas ela se lembra de que o
taxista desviou da rota e lhe mostrou uma arma. Fiquei pensando que, se alguém
estivesse acompanhando o trajeto dela e visse que o carro estava indo em outra
direção, a história poderia ter sido diferente", afirma Priscila.
A
arquiteta já começou a formular a proposta de um aplicativo que traga essa
possibilidade e que ajude a enfrentar a realidade do assédio sexual no Brasil.
Dados
de um levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP),
associação sem fins lucrativos, mostram que, em 2015, houve um estupro no
Brasil a cada 11 minutos e 33 segundos.
Priscila
Gama acredita que a realidade é muito pior, uma vez que muitos casos não são
notificados. Para a arquiteta, o medo do assédio provoca o cerceamento do
direito à liberdade e também traz limitações ao crescimento das mulheres.
"Deixar
de fazer um curso que ocorre no período noturno, por exemplo, pode gerar menos
possibilidades de networking ou de projeção profissional no seu local de
trabalho".
A
proposta do aplicativo foi apresentada na Startup Weekend BH 2015, um evento
realizado em Belo Horizonte, voltado para a promoção de projetos tecnológicos
inovadores.
"Como
arquiteta, não tinha familiaridade com o desenvolvimento de aplicativos. Mas
qualquer um podia subir no palco e apresentar suas ideias. Houve uma votação e
15 foram selecionadas para serem desenvolvidas. A minha ficou em segundo lugar.
E lá mesmo você faz contatos com pessoas capacitadas que têm interesse em
desenvolver o projeto com você", relata a criadora do Malalai.
O
projeto recebeu inicialmente o apoio do Lemonade, um programa de pré-aceleração
de startups. Atualmente, o Malalai conta com o suporte do Labora, um
laboratório de inovação criado pelo instituto Oi Futuro e que incentiva
projetos que tragam soluções para o desenvolvimento das cidades.
Questionário
No
processo de criação da ferramenta, foi aplicado um questionário em mais de 2
mil mulheres, com o intuito de identificar costumes comuns entre elas ao
efetuar deslocamentos. A pesquisa evidenciou o hábito de avisar conhecidos
sobre o destino e a preferência por escolher caminhos com ruas mais
movimentadas.
Um
segundo levantamento, com 300 mulheres, buscou identificar quais dados seriam
relevantes para a escolha do trajeto.
O
Malalai busca reunir informações de forma colaborativa. As usuárias podem
consultar o mapa e adicionar dados. Um ícone, por exemplo, é usado para
destacar as ruas com pouca iluminação. Outros mostram onde há lojas, porteiro,
segurança ou policiamento. Clicando nos ícones, é possível obter mais
informações, como os horários em que há presença policial ou funcionamento do
comércio.
O
nome do aplicativo é uma homenagem à paquistanesa Malala, vencedora do Prêmio
Nobel da Paz em 2014. Ela é conhecida por sua luta em defesa do acesso das
mulheres à educação na região de sua terra natal, no nordeste do Paquistão,
controlada por talibãs que impedem meninas de frequentar escolas. Quando tinha
11 anos, Malala começou a escrever para veículos ingleses sobre seu cotidiano.
Com o aumento de sua popularidade, ela foi alvo de uma tentativa de homicídio,
mas sobreviveu. Hoje, aos 20 anos e jurada de morte em seu país, a paquistanesa
mora na Inglaterra, onde lidera um movimento internacional pelo direito à
educação. (EBC)
Segunda-feira
18 de setembro, 2017 ás 00hs05
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