Com
aval do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), um grupo de parlamentares
liderados pelo deputado e jurista Luiz Flávio Gomes (PSB-SP) quer impedir que
juízes de primeira instância determinem medidas drásticas contra políticos,
como prisão, quebra de sigilos bancário e telefônico, além de busca e
apreensão. A intenção é blindar deputados, senadores, governadores, prefeitos,
ministros e outros agentes públicos de investigações e julgamentos chamados no
Congresso de “ativismo judicial”. A mudança será incluída na proposta de emenda
à Constituição (PEC) que reduz o foro privilegiado no País a apenas cinco
autoridades – presidente da República, vice, presidentes da Câmara, do Senado e
do Supremo Tribunal Federal (STF).
FORO PRIVILEGIADO – Em 2017, o texto foi aprovado pelo
Senado como uma retaliação à Corte, que, na época, começava a discutir a
restrição do foro privilegiado apenas para parlamentares. Agora, dois anos
depois, a PEC do Fim do Foro será discutida na Câmara e os deputados pretendem
incluir nela um salvo-conduto para proteger a classe política. Atualmente,
deputados e senadores, por exemplo, só possuem prerrogativa de foro perante o
Supremo para crimes cometidos no exercício do mandato. Governadores, por sua vez, são julgados
nessas condições pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Se a proposta da
Câmara for aprovada, na prática esse entendimento será revisto e a manobra
permitirá que políticos com mandato voltem a contar com mais privilégios.
Nos
bastidores, parlamentares dizem que a alteração na PEC é para evitar que juízes
de primeira instância, como Marcelo Bretas, responsável pela Lava Jato no Rio,
ou Luiz Bonat – substituto do atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, em
Curitiba – determinem a prisão de deputados e senadores ou mesmo outras medidas
cautelares, como afastamento de mandato, uso de tornozeleiras eletrônicas e confisco
de bens.
AVANÇOS –
O tema sempre despertou polêmica. Em 2017, o então senador Romero Jucá
(MDB-RR), que era líder do governo Michel Temer no Congresso, chegou a ironizar
a intenção do Supremo ao defender a PEC, que também acaba com foro privilegiado
para ministros da Corte e outros integrantes do Judiciário e do Ministério
Público. “Se acabar o foro, é para todo mundo. Suruba é suruba. Aí é todo mundo
na suruba, não uma suruba selecionada”, disse na ocasião Jucá, investigado na
Lava Jato.
A
proposta voltou a andar na Câmara na esteira da aprovação do projeto que
endurece a punição para abuso de autoridades, vista no Congresso como uma
resposta ao “ativismo judicial”. A Lei do Abuso de Autoridade – vetada em parte
pelo presidente Jair Bolsonaro – criminaliza condutas utilizadas em
investigações recentes no País, como a Lava Jato. O Estado apurou que, na
avaliação de líderes de partidos na Câmara, a lei do abuso serve como uma
“garantia” ao fim do foro privilegiado. Se a maioria dos vetos de Bolsonaro for
derrubada, a expectativa é de que a PEC entre na pauta de votações em outubro.
O sinal foi dado por Maia em reunião no dia 20 de agosto, na qual estavam
presentes Luiz Flávio Gomes, autor da emenda, e os deputados José Nelto
(Podemos-GO), Adriana Ventura (Novo-SP), Rodrigo Agostinho (PSB-SP) e Renata
Abreu (Podemos-SP).
EMENDAS – Desde o início do ano, deputados
apresentaram 14 pedidos para a inclusão da PEC do Fim do Foro na pauta de
votações da Câmara. A pressão sobre Maia começou ainda em fevereiro, quando um
grupo de parlamentares – capitaneados por Gomes e pelo senador Álvaro Dias
(Podemos-PR) – se reuniu com o presidente da Casa na residência oficial e
cobrou a discussão da medida. A solução encontrada foi limitar as decisões
cautelares, tratada como uma espécie de “transição” entre o fim irrestrito do
foro e a situação atual. “Não é a solução perfeita, mas foi o melhor caminho
que a gente conseguiu construir. Se, de cara, a proposta não acaba com o foro
privilegiado no Brasil, em dez anos todo mundo parecerá igual perante a lei”,
afirmou Adriana Ventura, coordenadora da Frente Parlamentar Mista da Ética
contra a Corrupção.
Para
Gomes, a emenda que cria o salvo-conduto temporário tem como objetivo atender
não só deputados e senadores, mas também a prefeitos e vereadores. “A gente foi
sentindo o termômetro. Descobrimos que há um temor da classe política de que
muitos juízes de comarcas decretem medidas duras, como prisões temporárias por
perseguição política. Sem esse dispositivo, um juiz poderia perseguir um
prefeito e mandar prendê-lo a toda hora, por exemplo. É uma medida balizadora,
que iguala todo mundo. Era preciso uma transição”, afirmou o deputado.
Procurado, o presidente da Câmara não respondeu aos questionamentos da
reportagem.
Renato
Onofre (Estadão)
Terça-feira,
(10 /09/2018)
Nenhum comentário:
Postar um comentário