"NÃO HÁ DEMOCRACIA ONDE O VOTO É OBRIGATÓRIO"

Se ainda nĂŁo ĂŠ, seja nosso novo seguidor

Amigos SP

2 de abril de 2017

LEVANTAMENTO APONTA QUE 80% DOS CONSELHEIROS DE CONTAS VIERAM DA POLÍTICA




ResponsĂĄveis por fiscalizar e julgar o uso de recursos pĂşblicos, 80% dos integrantes de tribunais de contas chegaram aos cargos apĂłs exercer mandatos eletivos ou altas funçþes em governos. O levantamento ĂŠ da ONG TransparĂŞncia Brasil, que atribui Ă  “forte politização” dessas cortes a ineficiĂŞncia no controle das atividades de governadores, prefeitos, secretĂĄrios e outros gestores pĂşblicos.

O estudo tambÊm aponta que quase um quarto dos conselheiros responde a processos ou jå foi condenado na Justiça por suposto envolvimento em ilegalidades como corrupção, improbidade administrativa e peculato (desvio de recursos públicos).

Na conta não estão os alvos da Operação O Quinto do Ouro, da Polícia Federal, que, na semana passada, prendeu cinco dos sete conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ). A suspeita Ê de cobrança de propina de empresas e políticos em troca de favorecimento em julgamentos.

A operação reacendeu a discussĂŁo sobre os critĂŠrios de nomeação dessas autoridades e sobre a criação de um conselho para controlar sua atuação, ainda inexistente. “O caso do TCE-RJ assusta por sua dimensĂŁo, mas nĂŁo ĂŠ fato isolado”, afirma o procurador de contas JĂşlio Marcelo de Oliveira, que atua perante o Tribunal de Contas da UniĂŁo (TCU) e preside a Associação Nacional do MinistĂŠrio PĂşblico de Contas (Ampcon).

Ele defende mudança na Constituição com o objetivo de acabar com indicaçþes polĂ­ticas para os ĂłrgĂŁos. “Nossa histĂłria mostra que a indicação polĂ­tica favorece a captura do ĂłrgĂŁo de controle pelo grupo polĂ­tico dominante, o que produz ĂłrgĂŁos de controle lenientes, omissos e menos rigorosos com os governantes integrantes desse grupo, sem falar no risco de corrupção”, afirmou Oliveira, autor do parecer que apontou as pedaladas fiscais nas contas do governo de Dilma Rousseff e que fundamentou o pedido de impeachment da petista.

Perfil

O estudo da TransparĂŞncia Brasil – feito em 2014 e atualizado no ano passado – analisou o perfil de 233 integrantes das cortes de contas, entre eles os nove ministros do Tribunal de Contas da UniĂŁo (TCU). Quase a metade (107) foi deputado estadual, 91 ocuparam cadeiras de secretĂĄrios estaduais ou municipais, 48 exerceram mandatos como vereadores e 22 chefiaram prefeituras. Em ao menos 59 casos, os nomeados sĂŁo parentes de polĂ­ticos, alguns deles do prĂłprio governador que os nomeou.

A principal razão para a politização das cortes Ê o mecanismo de preenchimento desses cargos, previsto na Constituição de 1988. Conforme a lei, nos TCEs, todos os sete integrantes são nomeados pelo governador. Desse total, um Ê de livre escolha dele. Outros quatro são indicados pela Assembleia Legislativa. Só os dois restantes têm de vir do quadro tÊcnico dos tribunais, sendo um do corpo de auditores e o outro, oriundo do MinistÊrio Público de Contas.

“Na prĂĄtica, a formação dos colegiados dĂĄ muito poder ao Executivo e ao Legislativo, que, em geral, estĂŁo alinhados”, afirmou a coordenadora de Projetos da TransparĂŞncia Brasil, Juliana Sakai, uma das responsĂĄveis pela pesquisa. Ela disse que a indicação para os tribunais ĂŠ cobiçada pelos polĂ­ticos por causa dos inĂşmeros privilĂŠgios dos cargos – que sĂŁo vitalĂ­cios e incluem remuneração de desembargador, prerrogativas de magistrado e foro perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ). “Eles ganham uma Ăłtima aposentadoria polĂ­tica e tĂŞm mais do que agradecer aos que apadrinharam a indicação.”

Segundo a Transparência Brasil, tambÊm são frågeis os mecanismos para evitar que autoridades envolvidas em crimes assumam os cargos. A Constituição estabelece, como prÊ-requisito, que os candidatos devem ter, alÊm de notórios conhecimentos para o exercício das funçþes, idoneidade moral e reputação ilibada, critÊrios não regulamentados e que acabam sendo interpretados livremente pelos governantes.

A Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), que representa os conselheiros, admite que o atual sistema de indicaçþes favorece a ingerência política. O presidente da entidade, Valdecir Fernandes Pascoal, tambÊm defende uma mudança na legislação para que a maioria dos integrantes passe e ser, obrigatoriamente, dos quadros tÊcnicos das instituiçþes. Na semana passada, ele apresentou ao Congresso uma proposta de emenda à Constituição que institui um conselho para fiscalizar a atuação dessas autoridades.

“EstĂĄ mais do que provado. Esse modelo (de indicaçþes) nĂŁo inspira confiança da sociedade. Da mesma forma que tem gente boa que vem da polĂ­tica, tem outros que nĂŁo conseguem se blindar. A função de julgar contas ĂŠ tĂŠcnica”, afirmou Pascoal.

Em raras situações, políticos suspeitos de corrupção foram barrados. É o caso do ex-senador Gim Argello (PTB-DF), que, em 2014, não conseguiu vaga no Tribunal de Contas da União (TCU) após uma campanha de auditores e procuradores que o fez desistir. No ano passado, Argello foi preso pela Operação Lava Jato e condenado por receber propinas de empreiteiras. Ele nega os crimes.

Dos 233 integrantes de tribunais no País, 53 são alvo de 104 acusaçþes na Justiça ou nas próprias cortes de contas.

Desde 2007, ao menos dez foram afastados de seus cargos, entre eles Robson Marinho, do TCE de SĂŁo Paulo, suspeito de receber propina de empresas integrantes do cartel dos trens. Ele tem negado envolvimento no suposto esquema. Procurado, nĂŁo se manifestou.

No Amapå, quatro integrantes do tribunal de contas foram obrigados a deixar os cargos em 2012, após a Operação Mãos Limpas, da PF, apontar suposto envolvimento num esquema que desviava recursos de órgãos públicos. Com a aposentadoria de um deles, em 2015, o então governador Waldez Góes (PDT) indicou para a vaga o ex-deputado Miguel Houat, o Miguel JK (PSDB), alvo de açþes na Justiça.

O tribunal chegou a negar posse ao conselheiro e o MinistÊrio Público tentou barrar sua nomeação na Justiça, mas uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) assegurou sua entrada na corte. A reportagem procurou o conselheiro na sexta-feira, mas, segundo sua assessoria, ele estava em viagem e não se manifestaria.

Compra de vaga

A PFjå apontou casos atÊ de compra de vaga em tribunal. A Operação Ararath indicou que o conselheiro SÊrgio Ricardo de Almeida, de Mato Grosso, pagou R$ 4 milhþes ao antecessor no cargo para assumir a cadeira na corte. Ele foi afastado em janeiro por uma decisão judicial.

O TCE-MT informou que o conselheiro afastado nĂŁo se manifestaria. Em pronunciamentos anteriores, Almeida negou ter praticado atos ilĂ­citos.

TCU

A assessoria de imprensa do Tribunal de Contas da UniĂŁo afirma que as decisĂľes dos ministros sĂŁo “eminentemente tĂŠcnicas”. Segundo o tribunal, a forma como estĂĄ estruturado o processo decisĂłrio “repele qualquer ingerĂŞncia externa ou interna sobre o exame das matĂŠrias”.

“NĂŁo hĂĄ espaço para que um ator qualquer possa ou queira interferir em tantas esferas tĂŠcnicas e afetar inĂşmeras consciĂŞncias de terceiros ao mesmo tempo”, afirma o TCU, referindo-se ao fato de que quadros tĂŠcnicos e integrantes do MinistĂŠrio PĂşblico acompanham todos os processos. (AE)

Domingo, 2 de Abril de 2017 ĂĄs 12hs00

Nenhum comentĂĄrio:

Postar um comentĂĄrio